Desejos, Segredos e Cia...

Friday, March 31

O silêncio é de ouro...


“O silêncio é de ouro” já escutamos várias vezes. Mas é provável que estejamos ficando surdos para nossas próprias lembranças. Ou vivências. Ou necessidades.
Você ainda se lembra do som do silêncio? Onde será que se esconde aquele silêncio necessário que nos fará ouvir também a nós mesmos? Pelo menos um pouco...
As ruas gritam o tempo todo. E parece que nos acostumamos a toda esta gritaria. Sons irritantes que invariavelmente passam a fazer parte dos nossos sons internos nos tornando insensíveis aos que continuam de fora. Todos os dias... sempre a mesma coisa...
Gente falando, gente gritando, gente berrando, gente xingando...
Crianças enlouquecidas, chorando ou apostando gritos mais altos com os próprios pais e com quem mais aparecer para enfrentá-las...
Carros buzinando, correndo, freando, voando com toda a potência dos seus “NOx”...
Caminhões e suas rodas tremulantes. Cachorros latindo. Papagaios repetitivos.
Construções que se iniciam com suas intermináveis marteladas. Carros de som.
E mais uma vez, mães berrando.

Sons do dia-a-dia. Sons da vida.

Mas bem que poderiam dar um descanso de vez em quando. Bem que o silêncio poderia tomar conta do lugar por um tempo. O botãozinho do volume da consideração, pelo silêncio do outro, deveria ser usado com mais freqüência, em tons mais elevados. Em nome do respeito ao silêncio das cicatrizes alheias que só o tempo apaga, mas que se agravam com o barulho incessante.
Sinto falta de reconhecer minha própria voz em silêncio. Às vezes, entre tantos sons e barulhos, preciso pronunciar algumas palavras minhas e com a minha voz para lembrar que eu estou ali. Que aquele lugar me pertence.
Eu também gosto dos sons. Afinal não sou surda e além disso, acho bom ouvir o burburinho dos dias acontecendo. Mas gostaria que existissem mais momentos de silêncio. E talvez por isso eu me sinta mais aliviada à noite, na madrugada. Quando posso ouvir soar o silêncio que ecoa do próprio silêncio. Silêncio do silêncio que há em mim. Somente aí posso decifrar no silêncio os sons que meu coração envia e que ressoam nos meus pensamentos.

Silêncios consumidos. Silêncio ensurdecedor. Silêncio acomodado.
Silêncio que respeita. Silêncio esquecido.

Eu definitivamente preciso do silêncio.
Com ele tento alcançar minha serenidade interior. É nele que me torno invencível e inatingível. É através dele que passo pelas minhas fases de manutenção da harmonia interna. Somente com ele minhas desequilibradas palavras se tornam um luxo do meu próprio silêncio.
E por isso, quando os sons me incomodam tanto, me deixando estressada e louca da vida sabe o que eu faço? Coloco uma música que gosto de ouvir, num volume bem alto, e a partir dali posso então ouvir e gostar dos meus sons, ao mesmo tempo em que desvendo as cores que se misturam perdidas por dentro deste meu próprio silêncio.

Silêncio colorido da minha alma.

"Silêncio é o espaço onde as palavras nascem e começam a se mover. Por vezes as palavras existem porque as dizemos. Dependem de nossa vontade: pássaros engaiolados. Mas no silêncio ocorre uma metamorfose. As palavras se tornam selvagens, livres. Elas tomam a iniciativa. Só nos resta ver e ouvir." (Rubem Alves)

Wednesday, March 29

Desenhos na areia...


Aquele decididamente era um pedaço dos seus sonhos.
Caminhava por entre espumas, conchas e corais. Seu caminhar naquela areia clara por incrível que pareça era fácil, sem nenhum peso ou esforço. Andava como se simplesmente... flutuasse.
O som daquelas águas a convidavam a refletir, num impulso meditativo. Era o seu mantra... Que a fazia se desligar de seu próprio corpo e viajar em suas sensações... sem nem perceber o que ocorria ao seu redor, apesar de que podia tentar imaginar. Mas não queria aquilo naquele momento... queria estar completamente ausente. Pelo menos em pensamento. E conseguia.
Como sempre o horário escolhido era o do encerrar do dia. E dali ela presenciava, no horizonte, o delicado e decidido beijo do sol no mar. Tão sublime... Agradeceu por aquele momento e também pelos inexplicáveis presentes que recebia todos os dias. Aquele lugar era mágico, ela já tinha constatado... e tinha o poder de fazer brotar em seus olhos lágrimas... de felicidade.
Contemplou com toda a pureza que possuía aquelas ondas que iam e vinham banhar seus pés, como que a convidando a participar da sua dança. O vento agora soprava frio contrastando com o calor do seu corpo, e seu vestido esvoaçante tornara-se o véu que escondia seus secretos desejos.
Continuou sua caminhada, de passos lentos e agora pegadas firmes, na areia úmida. Era momento de se recolher.
Avistou-o à certa distância, parado, olhando-a com olhos de criança, que espera ganhar o seu doce... o seu prêmio. Foi ao seu encontro, guiada por aquele olhar maroto que a hipnotizava. Chegou perto e notou os desenhos na areia. Emocionou-se com a simples, mas verdadeira, surpresa recebida. O abraço foi longo e envolvente e o beijo ansioso em alcançar seus sentidos. Partiram de mãos dadas, tendo como testemunha somente a Lua que já despontava naquele manto que os cobria e protegia.
Seu sonho agora estava completo.


"Amo como ama o amor. Não conheço nenhuma outra razão para amar senão amar. Que queres que te diga, além de que te amo, se o que quero dizer-te é que te amo?" (Fernando Pessoa)

Thursday, March 23

Sobre pensamentos perdidos...

"Eu queria pensar um pensamento tão difícil que eu não conseguisse pensá-lo"
(Jostein Gaarder)




...


Não quero pensar em nada
Nem em começo, meio ou fim
Quero apenas viver
Com tudo de mim...

...





Às vezes, eu sinto preguiça de pensar. Queria que meus pensamentos me dessem um descanso. E então existissem por conta própria... somente como suspiros do que eu sou.
Queria que o existir fosse menos desgastante. Sem muitas escolhas a fazer, muitas palavras a dizer ou ouvir, idéias a compreender... sem muitas dúvidas e incertezas a esclarecer ou planos a executar.
Meus pensamentos nunca ocupam um lugar fixo, estão sempre em mutação, perambulando entre minhas misteriosas incógnitas. Queria me esconder entre minhas nuances para incentivá-los a se tornarem impetuosos e então pagarem o preço da, muitas vezes, dolorida existência. Talvez devessem existir por existir... só para chegarem em algum lugar. Em qualquer lugar. Sem muita perfeição, sem muitos vínculos... como se fosse possível apagá-los, se necessário, para então recomeçar outra vez.
Quero mas tenho medo de deixá-los realmente correrem soltos. Preciso do que pode fazê-los frear. Preciso da minha consciência perniciosa que me faz contraditória. Será possível um dia eu me deliciar, sem culpa, com esses meus agitados sussurros internos que só se acalmam embalados por meus consentimentos? Será que ainda assim poderei saboreá-los como um prato requintado que desperta meu paladar e aguça todos os meus sentidos?
Queria. Queria mesmo. Que essa vontade me arrebatasse. Mas ainda não encontrei a minha coragem.
E por isso, por enquanto, prefiro deixar os meus porquês voando soltos, se eternizando num silêncio imaginário... que me acomete quando não estou a pensar... despenteada ainda pelos meus auto-suficientes sonhos.

... Você algum dia já parou pra pensar que essas palavras soltas, flutuando ao vento podem tocar alguém... tocar como o vento toca... meio que sem saber de onde realmente vem?...

"A metade dos nossos erros na vida vem do fato de que sentimos quando devemos pensar e pensamos quando devíamos sentir." (Lhurton Collins)

Wednesday, March 22

À luz do seu olhar...


Procuro o seu olhar no mais profundo que tenho. Olhos castanhos. Estou perdida... neste negro abismo em que caminho, e não encontro saída. Este seu olhar existe como uma estrela, deveras banhada pelo luar... Essa luz da qual meu amor nasceu. E ao alcançá-lo me sinto protegida. Sigo seu brilho misterioso, hipnotizada, tentando decifrá-lo. Nessa eternidade perdida seu olhar iluminou minha existência. Esse olhar que me traduz e me despe agora é meu guia. Ando sem destino mas sei que sempre vou morar onde meu coração estiver. E ele vive iluminado pelo seu olhar.

"...Eu quero ser exorcizado
Pela água benta
Desse olhar infindo
Que bom ser fotografado
Mas pelas retinas
Desses olhos lindos
Me deixe hipnotizado
Pra acabar de vez
Com essa disritmia..."
(M.V.)

Tuesday, March 21

Indecifrável reflexo...


...Olhos em forma de espelho, denunciam-me.
Coração buscando ser maior que a razão...
(P.C.)

E finalmente ela acorda. Se olha no espelho e não se vê. Sua imagem parece estar indefinida. Então se nega a se olhar.
O seu olhar queria enxergar mais do que aquele reflexo de alguém. O seu Eu. Desprotegido e refletido. Mentalmente se torna nômade do que existe escondido nela mesma e passeia pelo caminho absoluto que seria o ideal... sem complementos banais, sem características confusas, sem discrepâncias insistentes. Mas isto o espelho não reflete... Este caminho absoluto ainda se encontra por demais inacabado - quem sabe por conveniência - perdido entre rompantes de bravura ao mesmo tempo em que reverencia entusiasmado seus nobres princípios. Nobres e também exagerados.
O que enxerga é uma miscelânea de erros, covardia, irreverência e medo se confrontando. Um todo ímpio e impio.
Num ímpeto de conformismo sua imagem cede à toda essa inadaptação. Surge um reflexo verossímil. Que segue adiante com orgulho. Sem hesitar. Inspirando e expirando com o peito estufado e a cabeça elevada. Sem engasgar.
Diante de todo o radicalismo deste jogo de extremos, muitos que presenciaram seu reflexo a abandonaram... Desviaram daquele insólito percurso temerosos por essa forma ambígua de existir, enxergar o mundo, dar de si mesma e beber da vida.
Ela sabe que tudo aquilo é somente uma questão de escolha. Evidente na demonstração das fraquezas alheias. Mas primordial e inefável para manter seu raciocínio incansável, vivaz e sua vida saborosamente instigante.

"O essencial é invisível aos olhos; só se vê bem com o coração!"
(Saint Exupéry)

Monday, March 20

Insensata raiva...


"Amor, então,
também, acaba?
Não, que eu saiba.
O que eu sei
é que se transforma
numa matéria-prima
que a vida se encarrega
de transformar em raiva.
Ou em rima."
(Paulo Leminski)


"... As coisas mudaram. Ela mudou. Ela se tornou brava. Muitíssimo brava. A raiva tornou-a uma mulher triste e amarga...
... As pessoas não sabem amar. Mordem em vez de beijar. E batem em vez de acariciar. Talvez porque percebam como é fácil o amor se deteriorar. De repente, torna-se impossível, impraticável. Portanto, as pessoas o evitam e procuram consolo na raiva... medo e agressão, que estão sempre à mão e disponíveis. E talvez, às vezes, não tenham todos os fatos necessários...
... Raiva e ressentimento podem bloquear o caminho da gente... Agora eu sei disso. Para incendiar a raiva basta o ar e a vida... que ela traga e abafa. Mas é real. A fúria. Mesmo quando não é... Pode mudar você. Transformar você. Moldar você. Fazer de você algo que você não é.
Assim, a outra face da raiva é a pessoa que você se torna. E se Deus quiser, alguém que acorda um dia e percebe que não tem medo de sua jornada. Alguém que sabe que a verdade, na melhor das hipóteses, é uma história parcialmente contada de que a raiva, como o crescimento, vem em jatos e, em seu caminho, deixa uma nova possibilidade de aceitação. E a promessa de calma."(Texto extraído do filme "The upside of anger")

"Paciência e tempo dão mais resultado do que a força e a raiva."
(La Fontaine)

Friday, March 17

Cenário perfeito...


tateáVEL violáVEL imensuráVEL
flutuáVEL embaláVEL implacáVEL
embriagáVEL alucináVEL indagáVEL
despedaçáVEL amáVEL agradáVEL

memoVEL

O VELeiro se via ao longe. Pequenino. Ponto de luz perdido entre os azuis... flutuando manso entre as ondas cristalinas... marulho fraco e reconfortante...
Luzes refletidas fulgurantes... turbilhão de cores contrastantes... sons hipnotizantes... mente inquietante... enquanto o tempo ruía, petulante.
Sentada na proa estava ela, solitária, com a imensidão do mundo a seus
... pés.
Cenário mais que perfeito para deixar afogar aquela existência em
... viés.

...·´¯`·­» ...·´¯`·­» deseVEL ...·´¯`·­» ...·´¯`·­»

"... mAs CoMo SoPrA o VeNtO sObRe O mAr OcEaNo!..." (Mário Quintana)

Thursday, March 16

Por um novo caminho...


Depois de tanto tempo parada e calada sentiu necessidade de sair dali fechando portas e janelas.
Queria deixar para trás as sombras que bloqueavam e entristeciam aqueles dourados raios de sol, que agora ansiavam por iluminá-la. Havia ventado, chovido, feito sol, frio, chovido novamente... E ela tinha decidido interromper aqueles violentos ventos de furacão para fazer restar somente a brisa que a acalentava. De forma suave. Trazia agora todas as estações dançando em seu corpo...
Revirou suas memórias. Quebrou falsos sorrisos, enxugou seus olhos ainda umedecidos, traduziu sentimentos desconexos. Percebeu então que aquela já não era mais ela, era somente seu reflexo no vidro embaçado da janela. Foram-se embora aqueles sonhos tolos, aquele olhar de indagação e a maior parte das suas certezas bambas.
Recapitulou suas transformações com um sorriso envergonhado no canto da boca. Quis ter mudado de rumo antes... Agilizado suas redefinições. Tempo perdido. Tentou se encontrar enquanto se perdia naquele entrelaçamento de vontades e sentidos. Já era. Acabou-se. Não existia mais a vontade de fazer valer a pena.
Virou-se de costas decidida e saiu daquele lugar sem titubear... certa de que seu caminho era mesmo aquele. Deixou para trás aquelas desnecessárias lembranças. Afundadas no profundo poço de lama. Fétido. Sua visão estava turva, seu corpo cambaleante mas seu coração, aliviado. Destruira toda aquela estória sem sentido... aquelas letras tortas. Queria agora ser uma página em branco, reluzente, para escrever as novas linhas do seu caminho.
Antes de sair, quis conferir novamente portas e janelas e decidiu trancá-las com cadeados resistentes. Não custava nada se precaver.
Lá fora o sol já se escondia...

Alterando caminhos andados...
Saboreando sonhos construídos...
Seguindo passos dados...
Sem rumo ou ritmo definidos...
Soprando eu vou sozinha
Sem destino...
Enquanto me desfaço
Aos pedaços...
De sonhos e segredos
Desvendados por mim ...
(P.C.)

Wednesday, March 15

Homenagem à Hilda Hilst

"Os olhos dela são iluminados. O rosto é iluminado. Mãos delicadas, ela desenha no ar gestos brancos, desse branco que não há mais. Hilda Hilst é uma mulher. Uma mulher que se observa no espelho do quarto, nota as cicatrizes e sorri."



" Tô Só...
Vamo brincá de ficá bestando e fazê um cafuné no outro e sonhá que a gente enricô e fomos todos morar nos Alpes Suíços e tamo lá só enchendo a cara e só zoiando? Vamo brincá que o Brasil deu certo e que todo mundo tá mijando a céu aberto, num festival de povão e dotô? Vamo brincá que a peste passô, que o HIV foi bombardeado com beagacês, e que tá todo mundo de novo namorando? Vamo brincá de morrê, porque a gente não morre mais e tamo sentindo saudade até de adoecê? E há escola e comida pra todos e há dentes na boca das gentes e dentes a mais, até nos pentes? E que os humanos não comem mais os animais, e há leões lambendo os pés dos bebês e leoas babás? E que a alma é de uma terceira matéria, uma quântica quimera, e alguém lá no céu descobriu que a gente não vai mais pro beleléu? E que não há mais carros, só asas e barcos, e que a poesia viceja e grassa como grama (como diz o abade), e é porreta ser poeta no Planeta? Vamo brincá de teta, de azul, de berimbau, de doutora em letras? E de luar? Que é aquilo de vestir um véu todo irisado e rodar, rodar... Vamo brincá de pinel? Que é isso de ficá loco e cortá a garganta dos otro? Vamo brincá de ninho? E de poesia de amor? nave, ave, moinho, e tudo mais serei para que seja leve meu passo em vosso caminho. Vamo brincá de autista? Que é isso de se fechá no mundão de gente e nunca mais ser cronista? Bom-dia... Tô brincando de ilha."
(Crônica de Hilda Hilst para o "Correio Popular" de Campinas-SP )

"Que canto há de cantar o que perdura?
A sombra, o sonho, o labirinto, o caos
A vertigem de ser, a asa, o grito.
Que mitos, meu amor, entre os lençóis:
O que tu pensas gozo é tão finito
E o que pensas amor é muito mais.
Como cobrir-te de pássaros e plumas
E ao mesmo tempo te dizer adeus
Porque imperfeito és carne e perecível
E o que eu desejo é luz e imaterial.
Que canto há de cantar o indefinível?
O toque sem tocar, o olhar sem ver
A alma, amor, entrelaçada dos indescritíveis.
Como te amar, sem nunca merecer?"
(Hilda Hilst)

Tuesday, March 14

Imbranato...


"...sweet like candy to my soul... sweet you rock and sweet you roll... lost for you...
I'm so lost for you..." (Dave Matthews)

E de repente, sem nenhum aviso, acontece. Não em capítulos anunciados ou em sonhos reveladores. Completamente fugaz, com a ginga da malandragem, naquela insolência gostosa, o inesperado derrubou os muros da nossa lucidez, despedaçou as portas do nosso raciocínio tornando-o abstrato. Somos então invadidos pelo surreal e passamos a exalar o perfume da alma, que abre nossos poros, transborda em nossos olhos e arrebata nossa percepção, tornando vulneráveis todos os nossos segredos mais íntimos. Numa vontade louca de ocupar todos os espaços, jogamos os braços ao redor do mundo, querendo segurar entre os dedos o vento que nos embala. E então nos vemos flutuando. Desbravando trilhas ainda desabitadas e vislumbradas apenas em lapsos de felicidade, que são lavadas e purificadas por nuvens leves. O descolorido e sem graça cotidiano toma outras formas e incentiva uma empolgante mistura de cores. Nos vemos mais bonitos, nos encantamos com a beleza que nos cerca, o mundo se torna um oceano de mistério e de possibilidades. De repente, nos percebemos invencíveis. Passamos a decifrar no silêncio o som que o coração enviou e que agora ecoa no nosso pensamento. Incessantemente. A partir de agora passamos a ser conduzidos à direção ditada pelo coração. Os sentidos então estão cadenciados, em uníssono, pela melodia que chega soprando aos nossos ouvidos. Temos a confirmação de que realmente estava tudo escrito. Somos surpreendidos. Nos descobrimos finalmente e loucamente apaixonados...

"Se por acaso
a gente se cruzasse
ia ser um caso sério
você ia rir até amanhecer
eu ia ir até acontecer
de dia um improviso
de noite uma farra
a gente ia viver
com garra
eu ia tirar de ouvido
todos os sentidos
ia ser tão divertido
tocar um solo em dueto
ia ser um riso
ia ser um gozo
ia ser todo dia
a mesma folia
até deixar de ser poesia
e virar tédio
e nem o meu melhor vestido
era remédio
daí vá ficando por aí
eu vou ficando por aqui
evitando
desviando
sempre pensando
se por acaso
a gente se cruzasse... "
(Alice Ruiz)

Monday, March 13

Imperfeito amor...


Olho ao redor e o cenário para mim é intrigante e como também não dizer entristecedor...
Já se tornou normal e autêntico as pessoas estarem sozinhas, solteiras... como se entoassem, em coro, um grito infantil de independência.
Talvez seja por opção própria ou por ser mais fácil viver assim... não sei ao certo. Tenho comigo a idéia de que seja mesmo um misto dos dois. Parece que hoje ninguém quer ter trabalho ou investir tempo em um relacionamento - porque vou te dizer uma coisa, construir um relacionamento exige mesmo tempo e dá trabalho... e põe trabalho nisso! - Mas quer saber, quando olhamos para trás nos sentimos orgulhosos ao vermos que saímos vitoriosos... e já nem lembramos mais de quanto tempo investimos ou quanto trabalho tivemos. Descobrimos que vale mesmo a pena.
No dia-a-dia, na vida real, os amores não são fáceis e encantados como nos contos de fadas onde as mocinhas acorrentadas e indefesas aguardam serem salvas por seus másculos e corajosos príncipes. Todos os envolvidos, você e a pessoa escolhida para ser amada, são concretos, reais... cheios de defeitos mas também de qualidades.
Durante a adolescência sonhamos que o príncipe encantado chegará montado num cavalo branco. Ao atingirmos a maioridade diminuímos a exigência: o cavalo pode até ser pardo. E já adultas conscientes, admitimos que o cavalo nem seja mais necessário... ele foi transformado em um jegue.
À medida que o tempo passa enxergamos com maior amplitude e quanto maior o horizonte de possibilidades maior também as exigências que fazemos. Por não as alcançarmos, é mais fácil fazer com que nossas expectativas vivam acomodadas somente dentro de nossos corações. E por isso nos contentamos em viver sozinhos.
Ter opções para escolher já é difícil. E ter mais que uma opção faz nosso coração se confundir e se dividir para escolher. E realmente é difícil ter que escolher alguém a quem iremos dedicar todo nosso afeto. Todos nós, sem exceções, em algum momento, vamos participar deste leilão inevitável e insensato de amores... com direito a lei da oferta e demanda... umas vezes você procura, outras se oferece, e muitas, muitas vezes entra em promoção...
No mito do amor romântico o amor é todo poderoso e sempre vence a intransponível altura das torres, as madrastas malvadas, as maçãs envenenadas, os dragões furiosos... E aquele esperado beijo simboliza a finalização de todo este processo de busca, de sacrifício, de luta... metáfora do sonho humano... de um dia descansar finalmente nos braços de um eterno amor. Amor e paz. Mas a vida real... é mesmo real... sem fantasias... onde os príncipes e princesas não são tão belos e valentes, os cavalos não são tão brancos e os finais não são tão felizes e eternos assim.
O amor não existe assim tão estável. Ele só é possível mesmo quando entendemos sua precariedade. Somos uma mistura de qualidades e defeitos, belezas e feiúras, bondade e maldade, erros e acertos. O amor passa a ser real somente quando descobrimos o que nós e o outro temos de melhor e pior. Sem nos deixarmos cegar pelo que acreditamos ser verdadeiro ou possível numa projeção de nossas carências e idealizações.
Temos que enxergar o que existe e faz parte do nosso horizonte de possibilidades. E isso não é se contentar com qualquer coisa... mas sim enxergar, sem exageros, o que realmente existe e está mais próximo do que pensamos.
Acho mesmo que o príncipe encantado exista... mas para encontrá-lo é necessário tornar as expectativas mais reais, sem tantas fantasias. O amor da sua vida virá sim, com certeza... e provavelmente a pé... e não será tudo isso que você sempre sonhou. E você, a princesa... também não será assim tão perfeita e encantada... você bem sabe disso... E apesar de toda esta imperfeição, há grande possibilidade de serem felizes para sempre.
Então, sabe... temos mesmo que aprender a ser e aceitar... toda esta nossa forma imperfeita de existir...

Friday, March 10

Esse amor...


Abençoado este amor que chegou apressado e agora existe tranqüilo...
Que me enleiou em seus afagos como uma frágil e fina teia, despedaçando com delicadeza e persistência as minhas barreiras. Triunfando sobre meus temores e receios tolos, tratando as feridas que a vida fez em mim, me encorajando a me entregar novamente, afastando de mim o medo de não fugir... para não sofrer.

Idolatrado amor que me pegou de surpresa invadindo minha vida, tomando o tempo em suas mãos, e os meus sonhos em seu sorriso, fazendo brilhar os meus olhos e ganhando o meu coração. Amor que cresceu, se fortificou e hoje preenche meus vazios, alegra minhas horas, ilumina minhas noites... brilhando no meu céu feito estrela guia.

Venturado amor que permite meu silêncio murmurar palavras sem sentido, cúmplice do que há de mais insano em mim. Que bebe da minha alma e se alimenta do meu corpo. Que me tem, se dá para mim, vive em mim e ainda assim me deixa viver.

Este amor sempre me emociona quando me aperta entre seus braços, arrepia minha pele quando me acaricia, descompassa meu coração quando descansa o olhar sobre mim...

Ah! Este atrevido amor...

"Você é isso, uma beleza imensa, toda a recompensa de um amor sem fim.
Você é isso, uma nuvem calma no céu de minha alma, é ternura em mim.
Você é isso, estrela matutina, luz que descortina um mundo encantador.
Você é isso, é parto de ternura, lágrima que é pura, paz do meu amor."
(Luiz Vieira)

Thursday, March 9

Devolva-me...


Dá-me um pouco de você
Fica com um pouco de mim
Para me seduzir bastou aquele mistério no olhar...
Para me possuir um espaço de tempo infinito...
Aquele simples instante... fugaz
O fez voar para mais perto de mim
Ritmos envolventes...
Sensações conflitantes...
Sem nenhuma forma de julgamento
Sua presença suave... como o vento
Roubou todo o meu discernimento
Devolva-me um pouco mais do que sou...
Deixa-me lembrar o que restou de mim
(P.C.)

Wednesday, March 8

Mulher...


Não sei porque estabelecer um único dia para comemorar algo que é tão especial em todos os outros: SER MULHER!! Temos todos os dias ao nosso dispor nos quais nossa presença é constante, indispensável e incansável.
Acho que a mulher deve saber o que vale mais a pena e lutar pelo que quer mas de uma forma coerente. E não apenas como forma de auto-afirmação ou competição. Não acho que a mulher deva se masculinizar a fim de competir no mercado de trabalho mas também não acho que deva se esconder, se ocultar em casa e não lutar pelo que acredita. Devemos achar o meio-termo e fazer nossas escolhas. Não deixar de lado nossa vida pessoal com marido, filhos e casa e nem nos dedicar em excesso ao trabalho. Não precisamos de igualdade de direitos porque realmente não somos iguais. Qual o problema nisso?? Eu não quero e nem preciso ser igual !! As diferenças existem para serem complementadas. Realmente seria muito chato se fôssemos todos iguais.
Não me agrada quando alguém qualifica a mulher como inteligente ou não dependendo do seu tipo de trabalho ou de como escolheu dedicar seu tempo. Eu optei por estar em casa, por fazer o que eu gosto, por estar presente o tempo todo e já ouvi várias vezes: “Você é tão inteligente, está desperdiçando todo seu potencial...” Como se eu fosse uma pessoa, e principalmente uma mulher, pior por ter escolhido não trabalhar fora. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. E isso realmente não mede o grau da minha inteligência. Somente as escolhas são diferentes. O trabalho, os horários, o reconhecimento existem da mesma forma. Acredito que a mulher possa ser feminina, doce, presente, atuante, decidida onde quer que esteja. Dentro ou fora de casa.
Penso que o mais importante deva ser a mulher fazer o que lhe dá prazer. O saber transformar a inevitável, e também prazerosa, rotina do seu dia-a-dia numa sucessão de novidades e descobertas, mas sem desistir de seus sonhos. Aprendendo sempre com as novas experiências que serão transformadas em futuros acertos. A mulher é a estrutura emocional da família. Ela tem o sexto sentido à flor da pele... E sabe passar pelos contratempos da vida com resistência já que é dela que vem a força para se viver melhor.
Podemos ser delicadas e frágeis sim. E esta fragilidade não significa fraqueza. Para mim significa sensibilidade. A mulher inteligente sabe e faz questão de ser vista como “frágil”. Pois assim ela é tratada com respeito, carinho, amor, com cuidado... e é exatamente aí que ela demonstra a real “força” que tem. Ela tem um jeitinho todo especial para pedir, ser atendida e conseguir o que quer. Não precisa medir forças porque sua força está na persuasão. Sabe recuar quando necessário para se fortalecer, obter mais segurança, poder para então avançar e finalmente vencer as eventuais batalhas que surgem pelo caminho.
Ser mulher é algo encantador. Somos felizardas por podermos usufruir todas as emoções que existem sem nos sentirmos envergonhadas ou recriminadas. Podemos ser espontâneas e demonstrar nossos sentimentos sem sermos tachadas de sentimentalistas. Somente nós mulheres encontramos poesia em tudo, inclusive na dor. Buscamos respostas e explicações para todas nossas dúvidas e inquietações. Encontramos significados para todas as atitudes, nossas e dos outros. Nós acreditamos e confiamos na nossa vulnerabilidade. E podemos ser autênticas sem sermos exageradas.
Sorrisos, beijos, abraços, mãos dadas, palavras carinhosas, lágrimas... demonstram a nossa essência. O nosso coração é enorme, acolhe e protege nossa alma e serve como fonte de inspiração para os que nos admiram. A mulher é vida, tem vida e gera vida. E por isso ela sabe mais do que ninguém o significado e importância das palavras amor e amar.
Somos nós que temos a capacidade nada ridícula de reverenciar o passado, abraçar o presente e sonhar com o futuro. Somos nós as privilegiadas pela inexplicável honra e sabedoria que nos acomete quando necessário. Somos nós, mulheres, as bruxas, fadas, sereias que encantam e enfeitiçam movidas pelas fases da lua, pelas ondas do mar. Somos nós as capazes de com um jeito gracioso embalar a vida, sorrir de mansinho ou dar gargalhadas exuberantes, cantarolar suavemente, repreender com firmeza e ser presença querida de ternura e carinho. Somos nós as guerreiras que sabem lutar pela vida, defender o que é seu com garras quase felinas, espreitar e reagir com toques certeiros. Somos nós que temos o brilho reluzente e hipnotizante no olhar e a fragrância perfumada e inebriante que seduz os que nos querem bem.
Eu tenho muito orgulho e sou muito feliz em ser mulher. Não gostaria de ser de outra forma.
E por ser assim, eu comemoro e digo VIVA A MULHER sempre!
Não apenas hoje dia 8 de março (dia da mulher), não apenas no segundo domingo de maio (dia das mães), não apenas no dia das avós (que é mãe e mulher em dobro). Mas sim, viva a mulher todos os dias, todas as horas, minutos e segundos... porque mulher é sempre mulher o tempo todo... frágeis sim e com muita doçura e encanto.

“... Você é mãe do sol
A sua coisa é toda tão certa
Beleza esperta...
Você me deixa a rua deserta
Quando atravessa
E não olha pra trás...
... Você é forte
Dentes e músculos
Peitos e lábios...
Mulher das estrelas...
... Linda...
Mais que demais
Você é linda sim
Onda do mar do amor
Que bateu em mim
Você é linda...
E sabe viver
Você me faz feliz
Esta canção é só pra dizer
E diz...”
(C.V.)

Tuesday, March 7

Ainda um croqui...


Existo nas palavras perdidas
Aquelas que ninguém quer ler ou acredita
Começo no que ainda existe e não acabou
Sou como uma melodia desritmada
que precisa de tempo certo para ser apreciada
Não enxergo meu início e nem meu fim
enquanto isso, me perco no meu meio
Quero me adiantar e tomar conta de mim
mas me encontro descompassada
Ainda sou um croqui do que posso vir a ser
Lay-out incompleto...
Meus pedaços não se explicam e nem
se entendem... apenas se reúnem
e novamente se despedaçam
em uma violenta explosão
fazendo surgir uma nova reinvenção
de mim mesma.
Desperto a hesitação reticente
que está adormecida em mim
Ainda não encontrei meu ponto final...
(P.C.)

Monday, March 6

Decisões...


Após um dia de silêncio e escutando somente a si mesma ela decidiu esquecer tudo em que pensara, como se perdesse a memória, e começar vida nova.
Escreveu uma carta de despedida para seus pensamentos, idéias e desejos que sabia não iriam se concretizar. Abandonou de vez, e sem olhar para trás, tudo o que estava impossibilitado de acontecer. Sonhos desfeitos. Lucidez cruel.
Descobriu que os sonhos impossíveis, as vontades, as ilusões podem deixar de existir - e por diversas razões - mas sempre têm uma coisa em comum. São como estrelas cadentes... surpresa a emocionar, que num fantástico momento de brilho nos céus, acaba por nos cegar. Fugaz relance de eternidade, avassalador e que no instante seguinte, desaparece... Assim mesmo. Deixa de existir como se nunca tivesse mesmo existido. Momento etéreo. Instante agora insignificante mas ainda assim desconcertante. Os fragmentos despedaçados se perderiam em algum lugar no limbo do esquecimento. Local mais que apropriado e conveniente.
O vento foi responsável por tirá-la daquele redemoinho de lembranças e trazê-la de volta. Quebrou-se o encanto. Levou embora o que poderia ser um temporal e trouxe então a deliciosa brisa que lhe causou arrepios e a deixou sonolenta.
Sua noite foi de um frescor incomparável. Seu sono foi tranqüilo, velado por anjos, enquanto novos sonhos se formavam. Sonhos possíveis. Estes sim seriam concretizados pois traduziam o seu desejado equilíbrio. Eram símbolos da sua devoção.
No dia seguinte, acordou e encontrou um mundo totalmente mudado. Não por estar melhor ou pior mas simplesmente por estar diferente. Ela voltou assim a estar perto de si mesma. Voltou a se pertencer. Tomou conta do seu lugar. Finalmente, se reconheceu entre tantos vultos distorcidos. Sabia o que esperar e tinha certeza de onde chegar. Sabia que a luz da Lua estaria sempre banhando seu caminho. Ela continuaria apreciando seus momentos, escutando seu próprio silêncio... mas agora de uma forma que não mais fizesse doer... pelo menos, não tanto.
Sua alma então como que por encanto se acendeu... e ascendeu...

Todo meu sonho
pode ser possível
Ausente, insistente,
indiferente e até inocente
É meu presente
Silêncio e tormento...

Pode ser apenas
um desejo almejado
ou um porque capturado
Mas será intocável
até o momento exato
Instante reservado
Só meu.

Sinto pressa...
O sonho que sonho
não pode ser perder em mim
Pó ao vento... espalhado
Nunca, tanto faz
Meu sonho tem que ser
em algum momento
de todo capaz...
(P.C.)