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Wednesday, March 15

Homenagem à Hilda Hilst

"Os olhos dela são iluminados. O rosto é iluminado. Mãos delicadas, ela desenha no ar gestos brancos, desse branco que não há mais. Hilda Hilst é uma mulher. Uma mulher que se observa no espelho do quarto, nota as cicatrizes e sorri."



" Tô Só...
Vamo brincá de ficá bestando e fazê um cafuné no outro e sonhá que a gente enricô e fomos todos morar nos Alpes Suíços e tamo lá só enchendo a cara e só zoiando? Vamo brincá que o Brasil deu certo e que todo mundo tá mijando a céu aberto, num festival de povão e dotô? Vamo brincá que a peste passô, que o HIV foi bombardeado com beagacês, e que tá todo mundo de novo namorando? Vamo brincá de morrê, porque a gente não morre mais e tamo sentindo saudade até de adoecê? E há escola e comida pra todos e há dentes na boca das gentes e dentes a mais, até nos pentes? E que os humanos não comem mais os animais, e há leões lambendo os pés dos bebês e leoas babás? E que a alma é de uma terceira matéria, uma quântica quimera, e alguém lá no céu descobriu que a gente não vai mais pro beleléu? E que não há mais carros, só asas e barcos, e que a poesia viceja e grassa como grama (como diz o abade), e é porreta ser poeta no Planeta? Vamo brincá de teta, de azul, de berimbau, de doutora em letras? E de luar? Que é aquilo de vestir um véu todo irisado e rodar, rodar... Vamo brincá de pinel? Que é isso de ficá loco e cortá a garganta dos otro? Vamo brincá de ninho? E de poesia de amor? nave, ave, moinho, e tudo mais serei para que seja leve meu passo em vosso caminho. Vamo brincá de autista? Que é isso de se fechá no mundão de gente e nunca mais ser cronista? Bom-dia... Tô brincando de ilha."
(Crônica de Hilda Hilst para o "Correio Popular" de Campinas-SP )

"Que canto há de cantar o que perdura?
A sombra, o sonho, o labirinto, o caos
A vertigem de ser, a asa, o grito.
Que mitos, meu amor, entre os lençóis:
O que tu pensas gozo é tão finito
E o que pensas amor é muito mais.
Como cobrir-te de pássaros e plumas
E ao mesmo tempo te dizer adeus
Porque imperfeito és carne e perecível
E o que eu desejo é luz e imaterial.
Que canto há de cantar o indefinível?
O toque sem tocar, o olhar sem ver
A alma, amor, entrelaçada dos indescritíveis.
Como te amar, sem nunca merecer?"
(Hilda Hilst)

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