Desejos, Segredos e Cia...

Saturday, April 29

Ser um... e ser dois...


Olho para os lados em todas as direções... tentando achar algum sentido para os meus pensamentos confusos.
Como ser um ao mesmo tempo em que se é dois?
Tento buscar nas minhas recordações justificativas para o meu hoje que encham de coragem o meu amanhã. Como ser um casal sem interferir na existência do outro, simplesmente e, sem minguar todo o relacionamento?
Aos meus olhos, isto é o que me parece mais difícil. O conseguir co-existir com o outro sem atropelar a sua individualidade e sem anular a minha própria.
Penso e repenso... e o que sobra me diz que não dá para lutar contra. As pessoas simplesmente são assim mesmo... Cada uma com seu temperamento, sua personalidade, suas manias, suas crenças, suas vontades, suas idéias... Não tem como mudar isso. E pensando bem... ainda bem!
Individualmente somos capazes de tudo, estamos sempre disponíveis para o que se mostrar mais atrativo... sem cobranças, sem receios e também sem desconfianças... A dois a coisa já muda um pouco de figura. O que antes era possível e até engraçado, agora na maioria das vezes, torna-se completamente impraticável e até repudiado. E não nos atrevemos a titubear... tomando o maior cuidado para não boicotar o outro de alguma forma leviana.
A escolha simplesmente é nossa. E ela é consciente. Por nossa própria vontade escolhemos a cumplicidade, a confiança, a monogamia, a união. Opta-se por estar sempre junto, resolver tudo junto, fazer tudo junto... enfim, realmente VIVER JUNTO...
E no final das contas já nem mais achamos ruim... já nem mais nos sentimos invadidos ou incomodados. Passamos a ser um só, por todo o tempo e o tempo todo... em atitudes, em pensamentos... e, sentimos prazer com isso.
Nos sentimos realizados e orgulhosos por sermos sobreviventes, principalmente, de nós mesmos em um mundo tão individualista e egocêntrico.
Aquele rabisco surrealista que nos define enquanto somos crianças e estamos na pré-escola tornou-se mais complexo. Agora é um traçado mais definido e pessoal que pontua a nossa percepção nos lembrando do que somos, ou podemos ser, e nos fazendo existir como verdade pura e única. Juntamente com esta verdade adquirimos também uma necessidade constante de estarmos sempre nos esforçando para sermos entendidos e aceitos pelo outro...
E tudo isto porque com a inevitável e também saborosa maturidade... que traz arraigada em si mesma uma razão descomunal, ainda nos descobrimos - sem querer é claro! - desesperadoramente desastrados, desajeitados e famintos de amor... mesmo não tendo noção nenhuma disto...

“Um tal amor era uma doença grave, uma doença da qual nunca se cura...” (Consuelo de Saint-Exupéry)

Thursday, April 13

Sabor de chocolate...


Este meu amor tem sabor de chocolate... Daqueles que derrete na boca aquecendo a língua, entorpecendo os sentidos... alterando as minhas reações e fazendo meus olhos brilharem... acelerando meu coração e prolongando o meu prazer...
Esse amor com sabor indescritível não se acanha em ocupar minha boca... Se dissipa sorrateiramente e invade cada pedacinho de mim... impregnando com sua leveza e maciez todas as minhas sensações. E eu me perco... diante da realidade que se torna confusa...
Sua cor acastanhada refletida no fundo dos meus olhos me transporta para um lago borbulhante e aquecido... que me envolve e embala, despertando meu lado mais faminto enquanto perambulo zonza por entre seus caminhos de perfume adocicado.
Despretensiosamente, provei desse amor e ele agora corre através de minhas veias. E o seu aroma brinca com minhas necessidades, funde minhas percepções, erotiza minha presença, se desfaz com minha gula, satisfaz minha fome e me inspira a libertar meu lado mais libidinoso...
O sabor achocolatado desse meu amor aguça meus sentidos, tranqüiliza os meus hormônios, me torna lânguida e inspira meus devaneios. É agora meu único alimento... se tornou essencial ao se dissolver demoradamente em meu corpo. Simplesmente, me encantei por seu poder e agora sorrio sem limitações.
Então sabor... permaneça por aqui... e mais uma vez, me seduza com seu perfume, sacie o que parece insaciável em mim, me prenda entre suas garras viscosas e mornas e me faça derreter por você enquanto você se derrete em mim... entre meus lábios...
Quero me lambuzar com todo este seu sabor de chocolate...

Tuesday, April 11

A um passo...


Ela tinha todo o tempo pela frente mas negava-se a esperar por ele. Queria viver a toda velocidade. Ansiava em caminhar pela vida a passos largos. Queria atingir tudo o que tinha direito, no menor tempo possível. E não queria passar despercebida pelo que realmente valorizava.
Sempre acreditou que tinha nas mãos o poder de decidir os critérios do seu próprio merecimento. E desejava merecer mais que muitos. Não gostava de ser comparada à eles. Precisava que o diferencial fosse significativo e também notado e para isso se impunha determinada. Não abria mão do que acreditava, não cedia aos seus momentos de fragilidade... enfim, enfrentava todos seus receios... todos os seus fantasmas. E aqueles fantasmas já estavam perdendo suas vozes...
Ela sabia que podia ser diferente e por isso mesmo aprendeu a lidar com todos aqueles olhares tortos e infelizes. Eles já não mais a afetavam, influenciavam e muito menos interferiam no caminho já traçado para ser seguido... por ela mesma. Na maioria das vezes, guiava-se por rumo, por instinto e isso ela nunca soube explicar... ninguém jamais conseguiu entender... levando à um número sem fim de julgamentos impiedosos. Todo o seu poder encontrava-se intrínseco à sua presença; não podia mais se desvencilhar ou fugir... mesmo que desejasse. Ela era o que era e pronto.
Apesar da força negativa que sempre vinha em direção oposta, batendo de frente com ela, querendo minguar sua determinação, aprendeu a se admirar ainda mais diante dos corriqueiros reflexos oscilantes, que insistiam em confundí-la e em fazê-la desistir. Mas cada vez mais o peso daquilo tornava-se menor. As coisas pequenas passaram a ter um valor indefinível... e alegrava-se cada vez mais ao sentir o aroma de toda aquela sua auto-confiança, que se fortificara e tornara-se quase inabalável.
Já tinha se decidido e nada iria demovê-la daquele caminho. Esse era seu lema. E ela faria tudo para conseguir cumprí-lo. Apesar de muitas vezes, se sentir revoltada perante desacertados olhares de desaprovação, ou de comentários maldosos sussurrados na surdina, ela ainda era ela mesma. E não acalentava nenhuma idéia de renunciar às suas convicções.
Para não se perder e reforçar sua segurança eventualmente, olhava-se no espelho, que guardava e protegia todos seus segredos, e sorria ao se ver. Se orgulhava de todos os seus defeitos, ria de suas imperfeições, piscava para suas hesitações, debochava do que podia ofuscar seu brilho.
Apesar de tudo e de todos sabia que era vitoriosa pois tinha aprendido que valia mais do que tudo que pudesse fazê-la se sentir indigna ou desvalorizada. E sorriu mais uma vez diante da sua própria figura. Teve uma espécie de déjà vu de que realmente iria alcançar o que tinha vislumbrado. Uma alegria saborosa, e também poderosa, a atingiu em cheio.
E além de toda aquela velocidade com que queria viver tudo, da intensidade muitas vezes desconcertante que a tocava e a impelia a continuar buscando, decidiu perfazer o caminho de forma mais pausada, sem ultrapassar nenhum limite... porque não queria correr riscos... não queria cometer erros.
Sucumbiu àquela necessária urgência, por ela mesma... por sua sanidade...
Afinal, faltava pouco e ela encontrava-se a um passo da sua maior felicidade...

O que podemos ver é somente a metade do que realmente existe.

Friday, April 7

Amores extremos...


E por ter ouvido todas as palavras ditas ela pôde refazer todos aqueles caminhos que sabia serem mesmo confusos. Foi assim... relembrando coisas do passado que ela finalmente entendeu. Tinha o direito de escolha em tudo o que acontecia. Mas isso não garantia que o caminho escolhido fosse realmente o melhor. De onde ela se encontrava sentiu o perfume da cumplicidade. E aquele perfume era melhor que qualquer outro.

Ela achou que fosse uma mulher forte mas deixou-se levar pela paixão... E descobriu da pior maneira que não mais tinha controle de si mesma. Tinha ultrapassado todo o limite da sanidade. E atingia o extremo da inconsciência. Não podia encontrar nenhum equilíbrio em todo aquele excesso. Ficou tatuada na sua mente aquela imagem distorcida dos fatos. Sem nem desconfiar acabara cometendo os mesmos erros que criticava nas outras pessoas.
Descobriu da pior maneira que o que acreditava era mentira. Junto com aquele amor enaltecido sentia também ciúme, medo, angústia, descrença, dor... Se sentia asfixiada por tantos sentimentos extremistas e misturados. O que achava ser amor já não era mais... Aquele falso amor já não precisava mais de metáforas diante de tanta insensatez, exagero e falta de controle. Tinha se acostumado a inventar desculpas, argumentos e justificativas para continuar com aquela loucura, repetindo atos semelhantes que se baseavam, cada vez mais, em pensamentos deturpados. E então se viu vivendo num mundo de ilusão com medo da própria realidade. Fugindo de sua desprezada coerência.
Diante de tamanha ilusão, quem estava sobre o pedestal, naquele altar imaculado, finalmente despencara e ela também desmoronou. Tornou-se vazia... despedaçada. Se debateu não querendo escutar ou entender nada. E foi necessário um longo período até que alcançou um tênue momento em que o amor-próprio falou mais alto e conseguiu trazê-la de volta do limbo.
O gosto amargo da dor na boca ainda era sentido mas a consciência já tinha permissão para respirar um pouco enquanto o tempo se encarregava de varrer toda a poeira e teias acumuladas, trazendo de volta sua esperada dignidade.

Nem todos passam por esse tipo de amor mas os que conseguem sobreviver a um nunca esquecem das lições que foram aprendidas à força, e de mãos dadas com a dor. Esse tipo de amor nunca termina bem mas se saímos dele com a nossa esperança reestabelecida então podemos nos sentir vitoriosos por enxergarmos entre tantas cinzas um horizonte colorido. Que é real, nos enche de luz e nos aquece com o calor de uma manhã de céu azulado e sem nenhuma nuvem.
Apesar dos sonhos caídos, das esperanças divididas, do destempero e das lições de amargura descobrimos que amores extremos não são almas gêmeas porque ao invés de completar, arruinam e nos levam a cometer atos tresloucados... por estarmos temporariamente desmedidos. Esses amores extremos nunca nascem para durar. Mas nos preparam para sermos mais fortes e resistentes à um outro amor avassalador que possa nos pegar desprevenidos.
E a recompensa? Ah! Essa está logo ali... onde menos esperamos e ainda não podemos enxergar... Basta deixar ela se aproximar... com calma, tranqüilidade e simplicidade. Mais do que o fogo da paixão... esse amor calmo aquece o coração, o corpo, os pés... e acima de tudo traz de presente o alívio da alma ainda dolorida.

Thursday, April 6

Depois da sua janela...


O meu dia então escureceu... transformando-se em noite como num toque de mágica. A chuva derramava-se sobre aquele chão fervente. Mas mesmo assim mantive todas as minhas cortinas cerradas. Sabia que podia estar alimentando alguns pensamentos duvidosos e por isso quis entorpecer os meus sentidos para conseguir ouvir meu coração acelerado. Por sob aquelas colchas aquecidas nada podia me afetar e eu conseguia até sorrir. E então contei para mim mesma tudo o que eu sabia de mim.
Sabia que nada mais seria o mesmo. Nenhuma cor, nenhum lugar, nenhum som conhecido. Tudo seria diferente.
Depois de você por perto o vermelho nunca mais foi somente vermelho, o azul do céu já não mais existia como azul e o verde da folha quis se tornar mais verde. O sol que antes era amarelo então se transformou em ouro. E a Lua passou a gotejar prata naquele lago enegrecido.
Depois de você preciso procurar as cores dentro de mim para então reconhecê-las.
Depois de você não sinto mais falta do que eu poderia ter sido. Nem lembro mais daqueles olhares enviesados, clandestinos de quem sempre se manteve do lado de fora.
Depois de você minha perspectiva ondulante traduziu aqueles reflexos embaçados das minhas mensagens cifradas. Que somente quem era cego podia perceber.
Quero agora estar com meus olhos sempre voltados para sua janela. Aquela que protege a minha e por onde posso enxergar o que não vejo, conhecer o que desconheço e existir sem saber quem realmente sou.
Somente através dessa sua janela poderei me arrepender e sentir vontade de pedir perdão pelo que ainda nem sei, mas está por vir.
Somente através daquela janela, também encortinada, poderei permitir que o vermelho possa estar sempre tinto, que a folha possa existir sempre verdejante e o azul finalmente possa voltar a ser céu.

Wednesday, April 5

Saborosa iguaria...


Ela estava sentada ali, completamente desligada, inserida em um ambiente que não mais lhe pertencia naquele momento. Aquele turbilhão de pensamentos a dominava sem nem ao menos pedir licença, e parecendo não aceitar nenhuma recusa. Invasão sem trégua. Enquanto aguardava ser servida, lembrava, sentia, pensava... refazendo perguntas, e respostas, naquela sua mente inerte, no vácuo da sua respiração, por um tempo que não soube calcular. Queria estar em outro lugar. Precisava sair dali...
E então aquele casal que andava um em direção ao outro, sem nem perceberem, chamou-lhe a atenção... e não sabia o porquê. Aquele instante insosso foi estimulado pela visão dos dois e ela passou a criar um cenário que fulgurasse aquela ocasião... Abusou de cores, perfumes, sabores para reinventar aquele tempo presente temperado com uma sutil, mas poderosa, pitada de nostalgia...

Os dois andavam sozinhos... desacompanhados... Ela o viu e parou de súbito observando seus passos... e então ele a viu. Ficou desconcertado mas fez um movimento de cabeça como que dizendo "sim"... cumprimentando-a... e continuou indo em sua direção... com um sorriso malicioso estampado no rosto... que não conseguia disfarçar. Ficaram então de frente para o outro no meio de um alvoroçado corredor... mas ninguém parecia perceber aquela inquietude quase iminente.
Ele se aproximou para beijar-lhe o rosto... e ela pode sentir o calor da sua pele. Quente! Muito quente! O cheiro dele penetrou todos os seus pudores.. enquanto ele colocava uma das mãos em sua cintura... para então abraçá-la...Um abraço forte... envolvente... que fizeram todas as suas sensações entrarem em colapso... e provavelmente as dele também... Com certa hesitação se separaram... Ele fez perguntas, ouviu algumas respostas e quis saber onde ela estava indo. Ela iria almoçar e por isso estava indo esperar o elevador...
Neste momento, ele falou que também não tinha almoçado e perguntou se poderia fazer-lhe companhia... Convite irrecusável. Foram então esperar o tal do "elevador"... Providencialmente não era panorâmico e muito menos tinha ascensorista... Entraram. Estavam sozinhos... Ela se encostou em uma lateral... e ele em outra... distantes por aquele espaço oco e metálico mas não a ponto de impedir de sentirem o calor que os unia... como se fosse um imã...
Ela que vestia um vestido longo... amplo... de alcinhas... ficou ruborizada pelo calor inescrupuloso que a invadia cada vez mais... diante daquela presença muda... mas sorridente... e, também, pelos seus pensamentos infames... Será que ele estaria lendo sua mente?
Como que a respondendo... ele se aproximou um pouco ... e perguntou se ela tinha certeza que queria mesmo comer... enquanto a tocava levemente no rosto... Aquela sensação a desnorteou como se tivesse recebido uma descarga elétrica... potente. Retomou o ritmo da sua respiração e aproveitando a brecha da aproximação e do toque dele... ela pôde encostar seu corpo no dele e lhe falar no ouvido... que continuava com fome... mas agora fome ... dele.

O elevador parou... saíram de mãos dadas... sem dizer uma palavra... atravessaram uma porta de vidro que se entreabriu e que os separava do estacionamento daquele shopping. Continuaram andando rápido... tácitos, em uma direção certa para ele e completamente desconhecida para ela... Tinham se deixado seduzir por aquele mundo subjetivo... de fantasias... dos sentidos.... E aquela viagem estava apenas começando...

Peles quentes, molhadas... mãos insistentes... sons sussurrados...
palavras sem sentido... bocas gulosas... Confusão de sensações.
Corpos vibrantes e incansáveis, sugados e finalmente, esvaziados...

Delírios daquele instante interminável da sua imaginação. E o tempo passou tão rápido... Voou.
Descansou seus talheres sobre o prato. Sua sobremesa chegara ao fim.
Se deixou exultar pelo sabor adocicado e exuberante daquela extraordinária comida... água na boca...

Dos deuses para os deuses...